terça-feira, 2 de agosto de 2011

Bairros de Salvador

Origens dos nomes dos bairros de Salvador

Barris
Barris. Por que Barris? Por que o nome Barris?
Obviamente, senhores arquitetos, senhores engenheiros, quando forem à estação da Lapa, observem que o primeiro piso está sempre úmido, porque ninguém consegue arrolhar uma nascente; o primeiro piso da estação da Lapa é sempre úmido porque a água continua ali, embaixo, na fonte dos Barris. O nome é a resposta do óbvio, da busca da água de boa qualidade, potável e por isso se faz fonte dos barris. Ali, um homem chamado Barbacena, Felisberto Caldeira Branco Ponte de Oliveira e Horta fez a sua casa de moradia. Esta casa Felisberto Caldeira Branco foi mais tarde comprada pelo poder público, mas antes disso foi à sede do colégio Abílio, Abílio César Borges implantou ali o Ginásio Baiano, o primeiro estabelecimento de ensino de nível médio que nós tivemos aqui, no bairro dos Barris.
Essa casa foi também, mais tarde, quartel de polícia e depois foi demolida e hoje está no sitio onde ela era, a Biblioteca Pública do Estado. Essa é a historinha pequena do bairro dos Barris. Diga outro.

Rio Vermelho
No caso do Rio Vermelho, há a considerar o seguinte: “camarajibe”. “Camarajibe” é um nome que foi transformado pelo uso popular em “camurujipe”. “Camarajibe” é rio dos camarás. Quem conhece camarás aqui? Ninguém mais conhece, todo mundo é do asfalto. É uma florzinha vermelha, abundantíssima, antigamente tinha demais aí, na cidade.
Rio das florzinhas vermelhas, rio vermelho, daí nasce o nome do rio que foi propriedade da casa de Ibiza. Propriedade de Manoel Inácio da Cunha Menezes, que ganhou de sesmaria a terra que vai dali, da Mariquita até a sede de praia do Bahia, daí para dentro, a mesma coisa. Morou numa casa que eu ainda conheci e aqui, aqui ninguém conheceu, todo mundo é menino. Foi durante muito tempo sede do Aeroclube da Bahia, depois foi demolida e agora fizeram lá, aquela coisa. Ali estava a sesmaria de Manoel Inácio da Cunha Menezes do rio Vermelho.

Lapinha

Lapinha. Muito bem.
O que é uma lapinha?
O que é uma lapa pequena em termos de religião católica?
É um presépio.
Onde é que Cristo nasce? Numa manjedoura.
Uma lapinha, quem é do interior aqui sabe que ninguém fala presépio, fala lapinha mesmo. Uma lapinha é um presépio.
Quando os padres iniciaram a devoção ao Menino Deus, criou-se a capela da Lapinha e então o nome permaneceu. Era o limite norte da cidade no século XIX, tanto que até hoje, o exército libertador, o exército do Dois de Julho entra na cidade a partir da Lapinha, da Lapinha para a Liberdade era o interior.
Então, a homenagem ficou, ingressa-se na cidade a partir da Lapinha, a partir dali é que as forças de 1823 ingressaram na cidade.

Misericórdia

Misericórdia?
Todo mundo conhece aqui a lenda ou a história, não sei, depende da crença; da rainha de Portugal que protegia os pobres, levava comida contrariando a vontade do rei, Dona Leonor. Todo mundo conhece a história dela, de que em determinada altura ela foi interpelada sobre o que é que ela levava escondido no regaço, que era comida e coisas assim. Ela respondeu: são flores e abriu e eram efetivamente flores, ocorrendo o milagre.
A Misericórdia foi uma espécie de – eu estou falando, dando aula mesmo, não estou fazendo conferência nenhuma - A Misericórdia foi uma espécie de INPS da colônia. Para que você entenda a coroa portuguesa só tinha dois verbos, o verbo lucrar e o verbo ordenar; isso é não brigando e pagando imposto, está todo mundo feliz, não precisa brigar coisa nenhuma.
Mas as cidades cresciam, as cidades cresciam e as necessidades chegavam; é preciso enterrar os mortos, é preciso vestir os nus, é preciso ter os presos encarcerados, é preciso – em suma – realizar as obras de misericórdia. Criou-se então em Portugal, as casas da Santa Misericórdia que eram instituídas, como até hoje são as Santas Casas de Misericórdia, instituições privadas, particulares que se ocupam de atender àquilo que é a prestação dos serviços comunitários que cabe ao estado. Nós até hoje temos seqüelas disso na Bahia, o cemitério do Campo Santo é propriedade da Santa Casa da Misericórdia, a Pupileira, ali, no Campo da Pólvora, ali, em Nazaré é propriedade da Santa Casa da Misericórdia; o hospital Santa Isabel é propriedade da Santa Casa da Misericórdia; todos, heranças do tempo em que os serviços assistenciais estavam entregues aos particulares, o poder público não estava nem aí para saber quem está doente. Os hospitais da Misericórdia nasceram em função exatamente dessa situação. A rua onde está o hospital da Misericórdia, está lá até hoje o hospital, onde estava a repartição central, onde estava a capela, onde estava a administração, passou obviamente a ter o nome de Rua da Misericórdia.

Tororó
Tororó é onomatopéico, Tororó com Barris. São bairros que estão perto um do outro. Tororó é onomatopéico das águas do dique. Que era muito maior do que é hoje esse dique, é bom lembrar. Para você ter uma idéia, até o século XIX, você podia tomar uma canoa na Concha Acústica e navegar até a Tribuna da Bahia, atravessar tudo que hoje é o Vale dos Barris, ingressar no que ainda resta de dique, Fonte Nova não havia, era o dique propriamente dito, até chegar lá, no sangradouro do dique.
Quando se abriu, se cortou a meia encosta para fazer a ladeira dos Galés...
...Largo da Fonte Nova, para não confundir com a Fonte das Pedras, que é aquela que está lá, junto do estádio. Fonte Nova é aquela cá de baixo, onde se lava automóveis, tem mendigos por ali, essa é que é a Fonte Nova.

Liberdade

Liberdade. Aí era a estrada das boiadas. O boi que descia do sertão era comercializado na feira do Capuame, feira de gado, Capuame, que depois mudou o nome para Dias D’Ávila, hoje é a cidade de Dias D’Ávila, ali estava a feira do gado. Esse gado era trazido para o abate. O abate da cidade estava onde hoje é o terminal da Barroquinha, ali é que era o matadouro da cidade. Por isso que o rio se chama de rio das Tripas, porque os dejetos, as sobras do sacrifício dos animais eram jogadas no rio das Tripas. O rio das Tripas está lá, a Baixa dos Sapateiros não existe, ela é um rio canalizado, você anda por cima do extradorso da abóbada que cria a Baixa dos Sapateiros, o rio das Tripas está lá.
Então, este gado vinha pela estrada que você chama da Liberdade, que era a estrada das boiadas. Em 1823, por ali entrou o exército libertador e então, a estrada das boiadas passou a ser chamada estrada da Liberdade.

Brotas

Nossa Senhora das Grotas.
O falar popular é que transformou de Grotas em Brotas.
Nós falamos uma língua que é dinâmica, ela vai modificando no tempo.

Mouraria

No caso da Bahia, não foram mouros propriamente ditos, foram ciganos; mas isso é uma distinção que você está fazendo agora, na época, veio de fora, não era português, era mouro. Mouraria tem tudo a ver com o bairro da Mouraria lá, em Lisboa, dos judeus, como é um gueto, para usar uma palavra mais divulgada. O gueto dos judeus é a Mouraria dos mouros, é o lugar de confinamento dos moradores que eram maometanos.
Paripe, no subúrbio

Paripe é um julgado. Paripe é uma coisa interessante porque na verdade, Paripe, embora faça parte da cidade de Salvador, foi anexado judicialmente à cidade de Salvador muito depois da fundação, muito depois. No século XVIII, ainda Paripe não integrava – digamos – legalmente a área da cidade de Salvador, era um julgado; ou seja, um povoado de administração independente.
Amaralina

Amaralina era a fazenda Alagoas, que os mais antigos aqui se lembram da lagoa que havia lá, que foi tampada por um prefeito desses aí. A fazenda Alagoas que foi comprada por José Álvares do Amaral que rebatizou a fazenda com o nome dele, fazenda Amaralina.
Humaitá?

Humaitá era um clube brega que tinha lá. Quando eu era rapaz, o lugar de dançar era no Humaitá.
Humaitá, não é um nome antigo?

Não, nós somos de duas épocas diferentes, minha filha.
Então, começou-se a dar o nome Humaitá, que não tem nada com a história.
A Igreja de Montserrat, de 1659 aquela feição, mas ela já vinha de antes.

Origem do nome Montserrat e origem da comunidade negra em Salvador

Montserrat é em referência à virgem espanhola, trazida por um padre jesuíta espanhol que implantou lá a devoção a Nossa Senhora de Montserrat.
Africanos na Bahia, desde o primeiro momento que chegam escravos. Mas na verdade, nessa sala, eu não sei se tem muita gente aqui que se considere imunizado contra a anemia falciforme, acho que ninguém. Uns mais, uns menos; todo mundo aqui está meio pro lado de lá, meio pro lado de cá.
A densidade negra na cidade de Salvador começa muito tarde porque ninguém tiinha na cidade de Salvador quinze nem vinte escravos, não, tinha o mínimo bastante para o serviço doméstico. Onde era a mão de obra escrava reforçada era no Recôncavo, no negócio do açúcar. Com o colapso do açúcar, com a queda do açúcar, com a abolição da escravatura houve uma migração, os ricos empobrecidos vieram à busca de emprego público, foram ser tabeliães, foram ser coisas assim; os negros libertados vieram à busca de comida.
Uma vez eu escrevi um artigo que quase que dá zoada forte, o título do artigo era enorme, “Quem deu o almoço do escravo no dia 14 de maio?”.
Você já parou para perguntar isso?
Ele ficou com fome e veio buscar comida aqui.
Então, a densidade negra na cidade de Salvador não é da colônia, não; não é não; tinha sim, mas o bastante para pequenos serviços domésticos e acabou-se. A migração em massa se passa quando se esvaziam os engenhos de açúcar. Aí sim, vem todo mundo para cá.

História da negritude no Bairro da Liberdade?

Recentíssimo. Eu que estou falando aqui, sou do tempo em que a Liberdade eram quatro ou cinco roças, roças com bois e vacas e essas coisas.
Essa concentração de pobreza e negritude na liberdade é coisa de quarenta ou cinqüenta anos para cá, não é muito antiga, não. Outros bairros se embranqueceram, por exemplo, um bairro onde só tinha negro mesmo, que era o Caxundé; hoje ninguém mais sabe nem onde é o Caxundé quanto mais falar em negro lá dentro. Corresponde hoje ao Jardim de Alá, ali, na Pituba. O trator chegou, urbanizou tudo, fez casinhas bonitinhas e acabou com a negritude de lá.
A Liberdade não tem essa história negra, não; eram roças. Seu Chico Mãozinha era dono de tudo o que é hoje, Corta braço, Pero Vaz era a roça dele e eu conheci, eu estive lá, na roça dele, eu que estou aqui; portanto, não é coisa do século XVII, não. Eu vi, andei lá, como andei na Pituba com medo das vacas, com medo dos bois correndo atrás da gente.

Então, a cidade é um organismo vivo, um organismo dinâmico. Ninguém acredita que bairros inteiros não existiam a cinqüenta anos passados. Eu dei o meu exemplo aqui, existia um ônibus de Pituba que fazia a viagem três vezes por dia, de manhã, meio-dia e de noite, um ônibus, um só e ia até a porta do Colégio Militar, dali em diante você tinha que ir na paleta, a cidade acabava em Amaralina.
E quando chegava fim de ano.
Você alcançou a cidade acabando em Amaralina. O bairro de Amaralina era o fim de linha do mundo; onde hoje tem o quiosque que vende acarajé era uma porteira de fazenda e do lado de dentro estavam os bois de Seu Juventino, na fazenda dele. Não tinha Pituba, não senhor. Isso é do meu tempo, isso que estou falando, eu vivi.
Amaralina era uma fazenda particular, você não perdeu nada lá dentro. Se você entrasse, alguém ia perguntar: “O que é que a senhora quer na minha casa?”.


Ilha de Maré faz parte de Salvador?
Sim, Paramana, Maré, tudo isso, Itapitanga, tudo isso é Salvador para efeito ibegeanos.
Onde fica a ribeira dos galeões?

A ribeira dos galeões é o bairro da Ribeira.
Porque ribeira, em vernáculo, é o local onde o navio ou embarcação, tem uma oscilação de marés tal que permite que o barco fique em seco para trabalhar. Isso acontecia cá, na ribeira das naus, hoje não acontece mais porque já aterrou tudo, do segundo distrito para cima já não tem mais nada. E lá na Ribeira, onde ainda acontece isso na praia do Bogari. Repare que quem tem barco para consertar leva para lá porque ali é fácil, quando a maré baixa está seco.

Por quê existiu a Comarca de Paripe?
Você sabe o que é a comarca? A jurisdição de um juiz era limitada por uma comarca; então, Paripe, porque era distante, era outra comarca que não a cidade de Salvador, era um julgado, como se dizia na época, o julgado de Paripe. Depois, com as facilidades do transporte ferroviário, com a aproximação do subúrbio com o centro, o julgado de Paripe desapareceu e Paripe passou a ser um subúrbio como outro qualquer.

Fonte - http://www.cidteixeira.com.br/site/palestras.php?id=3